Amor e Paixão: Coisas que tornam a existência complicada, mas muito boa e muito rica de se viver
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(*) Marcos Vinicio Dias Ribeiro
O ser humano almeja e aspira. A felicidade faz parte da nossa aspiração enquanto humanos. Dentro deste contexto sociológico, ele espera, que o amor vá completá-lo, em aspectos que não dizem respeito ao amor, pois, não é puramente o amor que vai nos dar a felicidade, não é ele quem vai permitir que sejamos absolutamente felizes.
O que acontece geralmente é que as pessoas se unem segundo um modelo de romantismo em que esperam que o companheiro ou o parceiro seja tudo na vida dela, que ele possa realizá-la sexualmente, afetivamente e emocionalmente e este quantum de expectativas vai gerando uma agonia uma asfixia da possibilidade amorosa. Tanto, que se fossemos um pouco mais cuidadosos e lêssemos a origem do romance encontraríamos “Abelardo e Heloísa” tragédia que termina em morte, “Romeu e Julieta” mais morte, desespero agonia e chegamos, ao ponto, de analisar que o amor romântico que tem sido a base da nossa forma de relacionarmos, desde o princípio nos condena a sermos infelizes. Tudo porque superestimamos o papel do amor e damos uma responsabilidade muito maior ao parceiro a que realmente ele tem, pois, achamos que ele tem que preencher todas as nossas lacunas como se isso fosse possível. Mas o ser humano é incompleto por natureza. E sempre será incompleto, porque o que nos move e nos faz crescer é a falta, é aquilo que nos faz falta e nos faz desejar. É o desejo que nos permite continuar construindo e avançando na construção de um projeto de convivência de um projeto de laço amoroso e social mais interessante e saudável.
No meio de toda esta situação de amor romântico encontra-se esta coisa de idealizar e esperar. A sensação que temos é que hoje estamos divididos entre esta visão romântica de procurar a nossa metade, de procurar o “príncipe encantado” ou a “bela adormecida” e a coisa do momento imediatista, a troca de parceiros acelerada. Na verdade é um jogo onde o homem corre da mulher pelo medo do compromisso e por sua vez a mulher fingindo não querer um compromisso e “doida” para encontrar o seu “príncipe encantado“.
A verdade é que temos cerca de 5 mil anos de cultura ocidental e nestes anos nós aprendemos algumas coisas tais como: conviver com a angústia, como conviver com a dor, com a falta, e transformar a falta e a ausência, em algo curioso e interessante. Se formos pegar a questão da tecnologia vemos que o automóvel é um espaço vazio cercado de tecnologia por todos os lados, aí é que está a criatividade humana é transformar o vazio em um convite para a construção. Acontece que neste final de século, principalmente na segunda metade do século XX e após a Segunda Grande Guerra nós estamos vivendo de uma maneira extremamente acelerada um processo de cultivo do hedonismo, ou seja, o prazer pelo prazer, o prazer para ontem. Isto é tão característico em nossa sociedade que as pessoas em vez de apenas construírem e se esforçarem e se organizarem no sentido de construir uma relação feliz e mais amorosa e interessante diante da vida. Elas querem a realização já deste projeto. E isto vai resultar na denegação do próprio desejo, ou seja, elas passam a renegar aquilo que desejam e apenas buscar aquilo que possam satisfazê-las.
Em uma outra análise sociológica e psicossocial vemos que é um universo bem próximo da relação do universo da droga. Quem usa a droga, usa para ter um prazer imediato, mesmo que isso possa representar uma decadência quase que completa da sua existência em todos os outros níveis que não naquele momento específico. Quando nós começamos a relacionar com as pessoas como se elas fossem drogas a vida fica com certeza meio drogada, fica meio chata, meio desagradável e é o que está acontecendo. Nós vemos esta busca desenfreada do prazer. Isto acontece nos dois sexos e é mais notada na mulher que no homem. Nos divãs de psicanalistas podemos encontrar muito mais homens que lamentam a impossibilidade de encontrar uma parceira que possa lhe ser fiel, que mulheres com este tipo de guinado. A sensação que temos é aquela cena clássica onde os dois se encontraram numa festa, num “per group” e saem uma vez e depois a mulher fica ali roendo as unhas ao lado do telefone esperando ele ligar o que não acontece. E ela se aniquila e ele não liga mais. Tem até o caso de uma amiga minha que estava esperando o telefonema do rapaz pela segunda vez, era uma sexta-feira à noite e ela disse: “Eu sou uma mulher moderna emancipada e não estou nem aí, eu vivo muito bem sozinha e vou pegar um filme em uma locadora e esquecer“. No balcão da locadora o telefone toca e ela atendeu esperando ser o rapaz a lhe procurar. Esta é a ansiedade em último grau.
O certo é que cada dia fica mais difícil para as pessoas realmente terem uma maior clareza do que realmente é um projeto amoroso. É super legal, ser casado com uma pessoa em que se vai a alguns locais em que as vezes ele é marido dela e em outros locais ela é a esposa dele. Esta possibilidade de ver uma pessoa, que no caso é a esposa, que trabalha, que faz sucesso, que cresce, que tem amigos, que tem família, e uma série de outras interações com o mundo e traz para dentro de sua relação uma riqueza que dificilmente deixa o homem entediado frente a vida e isto também tem que acontecer vice versa. Mas para a maioria das pessoas isto é difícil, pois, não tem esta atitude de buscar um projeto de vida, um compromisso. E a palavra “compromisso” é maravilhosa porque ela vem do latim dessa promessa que se faz junto com alguém. Desta busca, não de completude, mas de companheirismo de “Koynonia“, de dividir o mesmo pão. O pão da alegria, o pão da dor, o pão da angústia, o pão da vitória e até mesmo o da derrota. Então, quando você busca o prazer para ontem, na primeira briga, na primeira confusão, na primeira grande crise e que são necessárias para o crescimento da relação amorosa, se desfaz esta relação.
Neste contexto de relacionamento surge o “danado” do ciúme, que sabemos que não devemos ter, que não é saudável, que é uma bobagem, mas nos consumimos por causa dele e com isto surge uma interrogação: o que fazer com esse tal de ciúme?
No nosso momento atual nós temos que pensar no ciúme numa vertente paranoica, numa outra vertente que é quando o sujeito começa a acreditar que o outro vai fazer o que ele mesmo está fazendo ou uma terceira causa, é transferência de atitudes. A primeira é quando desejamos alguma coisa, porque todos nós um dia iremos desejar projetos impossíveis, mulheres impossíveis, homens impossíveis e assim sucessivamente. Na verdade não é que estejamos desejando o projeto, mas sim desejando o impossível. O impossível sempre moveu a vida humana. E na medida em que desejamos o impossível, passamos a crer que o nosso parceiro, a pessoa que convive conosco, também ela irá desejar ou terá desejos impossíveis, e isto pode ser até verdade ela poderá desejar mesmo. E com isso começamos a temer que o desejo impossível do outro possa movê-lo para longe de nós. E então nasce o medo da perda. Numa segunda vertente é porque uma pessoa trai o companheiro, não é fiel, não o ama, que apenas se vinculou ao seu parceiro de uma maneira possessiva, violenta e tudo mais. Esta pessoa certamente passa a querer ter o outro não como alguém que seja um companheiro, mas como uma posse, um objeto de propriedade exclusiva. O que leva as pessoas a pensarem que podem até matar o outro, caso o outro, não deseje mais estar com ela. É uma coisa patológica. Numa terceira vertente, é quando a pessoa traz consigo codificações. Esse sistema de código localizado no inconsciente começa a ser formado desde o relacionamento intra-uterino até o momento atual onde em um dado momento esta pessoa sofreu o abalo de uma rejeição por uma infinidade de relacionamentos, seja familiar ou não, causando uma ab-reação nos novos relacionamentos, ou seja, uma revivência de uma experiência desagradável através da linguagem ou atos, visando a descarga da emoção reprimida. Nesse momento acontece o processo de redução da tensão emocional pelo alívio (em palavras ou ações, ou ambas) da experiência que causou a tensão.
O certo é que quando nós amamos, queremos a atenção do outro, queremos o amor do outro, o reconhecimento amoroso do outro. E quando se vê diante de uma situação em que a relação que temos com esta pessoa está ameaçada surge uma defesa natural.
Uma coisa também é certa, não se pode amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo. O que é possível é amar alguém e desejar outro. Porque o desejo acontece apesar de sua vontade, ele tem uma profunda vinculação com a fantasia, e muitas vezes você pode ser assaltado pelo desejo mesmo estando comprometido ou estando amando, esta é uma questão do “homem natural”. Aí que entra uma parte que é fundamental: é a hora da escolha. Da escolha responsável, que é uma coisa muito bonita, porque “responsabilidade” é a habilidade de encontrar respostas para suas próprias questões, para sua própria vida. Amar de maneira responsável é defrontar-se com esse assalto do desejo e saber que exatamente por você ser humano, você não tem que realizá-lo necessariamente. Você pode abrir mão dele, em função de um desejo, que é maior, que é mais amplo, mais belo e que preenche muito mais. E é neste contexto que nasce a “fidelidade”.
Com certeza esta análise não fica muito simples para todas as pessoas. Pois, no mundo das escolhas, onde você pega o controle remoto e sintoniza num canal e acha que está sendo lesado por estar perdendo o que passa nos outros, também se transfere para a vida afetiva. Isto também reflete na vida amorosa. Parece que as pessoas escolhem um parceiro e com um controle na mão indagam a si próprias, que existem tantas pessoas interessantes pelo mundo, que vira uma opção de canais de TV.
O importante é salientar que quando fazemos uma “escolha” é “ex-cum-lex“, ou seja, é algo que acontece de dentro para o exterior, que acontece junto com (não é solitário, é solidário) e que, obedece, uma certa lei, que é a lei do seu desejo, mas é também a lei do seu compromisso. Então a partir do momento que eu faço uma escolha todas as outras escolhas passam a ser impossíveis? Não! Elas continuam possíveis, mas se eu fiz uma escolha, eu não tenho que pensar no impossível ou na possibilidade de uma outra escolha. Eu tenho que pensar no impossível da minha escolha. Porque não tem nada mais interessante, mais impossível que amar. E no momento que eu volto para isso que é o impossível do meu amor por aquela que eu escolhi, é que eu passo inclusive a ter a chance de ultrapassar essa impossibilidade e fazer a decisão racional. Esta é a chance de um encontro, mesmo que não seja um encontro que a todo o momento vai estar perfeito, pleno e belo, mas que permita que eu me sinta mais humano, verdadeiro, compromissado com a vida, comigo mesmo, com meus semelhantes. Porque se não, eu vou passar a vida escolhendo… escolhendo… e escolhendo, mas sem fazer escolha alguma, correndo o risco de passar a vida num processo intermitentemente de procura e quando se resolve escolher não se tem mais tempo. É como um personagem de uma peça teatral, que defendia até a última instância a liberdade de escolha. Ele defendia tanto esta liberdade frente a vida que ele mesmo não escolheu nada, ele escolheu a solidão. A relação nunca pode ser simplesmente o projeto de alguém, se não ela terminará antes mesmo de começar. Mas um relacionamento deve ser uma porta por onde se passa para construir a vida em diversos níveis onde um é solidário ao outro, e isto, passa a ser muito interessante.
Com tudo isto resta-nos dizer que: “O amor humano com certeza pode não fazer o mundo girar, mas eu sou obrigado a admitir que ele torna a viagem muito mais interessante”.
(*) Cientista Social, Bacharel em Teologia, Bacharel em Direito, Psicanalista Pela SPOB, Pós-graduado em Docência Superior, Pós-graduando em Filosofia e Sociologia e Mestrando em Teologia.
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